TODAS QUE SOU

Entre mil versões de mim, sigo tentando me encontrar inteira.

por rayla peixoto

Sul Fluminense

Não nasci dividida, mas me partiram em mil pedaços de expectativas.

Profissional impecável durante o dia, mãe atenta à noite, parceira disponível nas sobras de tempo. A sociedade aplaude minha exaustão chamando-a de competência.

Carrego no corpo um mapa de cuidados: rotas seguras para evitar assédios, sorrisos estratégicos para desviar conflitos, força calculada para parecer capaz sem ameaçar.

A violência está nas manchetes, mas também nos sussurros: no colega que explica o que já sei, no parceiro que “ajuda” com o próprio filho, no estranho que transforma meu “não” em desafio.

Minha bolsa guarda relatórios e curativos. Meu celular, alarmes para reuniões e para que minha filha tome remédio. Minha mente, um gerenciamento constante de prioridades impossíveis.

A exaustão não é fraqueza, é resultado de um sistema que espera que eu seja todas, ao mesmo tempo, sem falhar em nenhuma.

Resisto não apenas sobrevivendo, mas insistindo em florescer nas fraturas. Minha existência completa é, por si só, revolução silenciosa contra um mundo que me quer em pedaços convenientes.

Não me celebre por ser múltipla. Questione por que precisei me multiplicar.

 

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