Por Sulamita Fonseca
Para discutirmos a violência contra a mulher, é essencial reconhecer que ela não se limita à agressão física ou às ameaças de morte. Muitas vezes, a violência se manifesta de formas sutis, e é justamente aí que reside o perigo. A violência é um processo evolutivo; ninguém acorda um dia e decide ser agressor. Esse comportamento é construído e testado socialmente ao longo do tempo, e a violência aumenta à medida que os limites são experimentados e ultrapassados. Um dia é uma humilhação, no outro uma proibição, depois gritos, ameaças, agressão física e, em casos extremos, feminicídio.
É preciso gerar a cultura da denuncia
Agora, imagine um mundo onde essas formas de violência fossem reconhecidas e denunciadas desde o início. Um mundo em que a justiça tratasse com seriedade os crimes de violência psicológica e moral. Isso certamente funcionaria como um freio para a escalada da violência, impedindo que as ações abusivas evoluíssem e se tornassem mais graves.
Nas centenas de palestras que já ministrei, enfatizo, quem não denuncia contribui para a perpetuação desses crimes. Por exemplo, quando um homem faz comentários de conotação sexual que são repugnantes para qualquer mulher e nós não denunciamos, estamos, de certa forma, permitindo que essa atitude continue. Isso é crime de importunação sexual e vai evoluir como toda violência.
Imagine se esse mesmo senhor encontrasse uma mulher em uma rua deserta em condições favoráveis, ele se contentaria em apenas falar? E se ele estivesse na custódia de uma criança indefesa, ele se contentaria apenas em falar? Denunciar todas as formas de violência e importunação, por mais sutis que pareçam, é crucial. Ao fazermos isso, contribuímos para a prevenção de crimes mais graves, como o estupro e o feminicídio.
Não podemos ser coniventes e nos resignar diante da agressão.
Ainda no contexto dos “testes” de limites, é importante reconhecer que a violência muitas vezes é mais intensa dentro de casa, no âmbito da intimidade familiar. Ao entrar em um relacionamento, se você perceber que está sendo testada em relação à violência – seja por meio de proibições sobre onde você pode ir, com quem pode se relacionar ou como deve se vestir – não permita que esse comportamento se perpetue. Se um agressor percebe que pode testar seus limites sem consequências, ele se tornará mais habilidoso em manipular e controlar, o que o tornará um agressor mais capacitado para futuros relacionamentos.
Devemos adotar a ideia de não permitir que nenhuma forma de violência cresça e persista. Ao fazer isso, estamos protegendo a nós mesmas e contribuindo para um futuro mais seguro para todas as mulheres. Denunciar e confrontar todas as formas de violência é um passo fundamental para criar um ambiente mais justo e seguro para todas.
Segue a baixo as tipificações de agressão contra mulher. Certamente toda mulher já passou por algumas dessas agressões e nem sabia que se enquadrava em crime de agressão. É necessário informação para a conscientizar e, só então, o combate será eficaz.
1. Violência física:
– Envolve qualquer ato que cause dor ou lesão física, como bater, empurrar, chutar, ou usar armas.
2. Violência psicológica:
– Inclui qualquer comportamento que cause dano emocional ou psicológico, como ameaças, humilhação, manipulação, controle excessivo ou isolamento.
3. Violência moral:
– Refere-se a ataques à dignidade e honra da mulher, como calúnias, difamação e insultos, que afetam a autoestima e reputação.
4. Violência sexual:
– Envolve qualquer ato sexual não consensual, como estupro, assédio sexual, coerção para práticas sexuais indesejadas e abuso sexual.
5. Violência patrimonial:
– Envolve a destruição, retenção ou apropriação dos bens materiais da mulher, como a destruição de objetos pessoais, controle financeiro ou retenção de documentos importantes.
6. Violência institucional:
– Refere-se à forma de violência que ocorre dentro das instituições e sistemas, como a falta de acolhimento adequado por parte das autoridades, discriminação e inadequação das políticas públicas para proteger as mulheres.
Cada uma destas formas de violência pode ocorrer de forma isolada ou combinada, e é essencial reconhecer e abordar todas elas para garantir uma proteção.